Somos mesmos uma Fraude?

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15 hours ago

Photo by Kenny Eliason on Unsplash

Vivemos em uma sociedade que valoriza a imagem, o sucesso e a perfeição. Diante dessas expectativas, é comum que muitas pessoas se sintam como fraudes, como se estivessem fingindo ser algo que não são. Essa angústia, no entanto, não é um defeito individual, mas uma consequência da forma como construímos nossa identidade. A psicanálise, especialmente a partir da visão de Jacques Lacan, oferece um olhar profundo sobre esse fenômeno, mostrando que a sensação de impostura é parte da condição humana — e que aceitar essa ambiguidade pode ser libertador.

Desde a infância, somos influenciados por ideais externos. Nossos pais, a escola, a mídia e as redes sociais nos apresentam modelos de como devemos ser: bem-sucedidos, felizes, confiantes. Esses ideais funcionam como espelhos nos quais nos miramos, tentando nos encaixar. O problema é que, ao buscar corresponder a eles, muitas vezes nos afastamos de nossas verdadeiras emoções e desejos, criando uma sensação de falsidade. Lacan explica que essa divisão entre o que somos e o que mostramos ao mundo é inevitável, pois nossa identidade nunca é totalmente fixa — ela se forma a partir das relações com os outros e das expectativas sociais.

A psicanálise ajuda a desconstruir essa angústia ao mostrar que a “fraude” não é uma falha pessoal, mas um reflexo da maneira como nos constituímos como sujeitos. Todos nós, em maior ou menor grau, usamos máscaras para nos adaptarmos a diferentes contextos. Isso não significa que sejamos falsos, mas que nossa identidade é fluida, moldada pelas circunstâncias. Compreender isso permite que nos libertemos da cobrança por uma autenticidade impossível, pois não existe um “eu verdadeiro” estático — existem apenas as muitas versões de nós mesmos que surgem ao longo da vida.

Além disso, a psicanálise nos ensina a lidar com a falta, ou seja, com aquela sensação de que sempre falta algo para sermos completos. Lacan afirma que perseguir a perfeição é uma ilusão, pois a incompletude é inerente à existência humana. Quando aceitamos que não precisamos ser impecáveis para merecer respeito ou amor, diminuímos a pressão por corresponder a ideais irreais. A análise nos convida a olhar para nossas máscaras não com vergonha, mas com compreensão, reconhecendo que elas foram criadas como formas de proteção ou adaptação.

O caminho para a autoaceitação passa, portanto, por abandonar a busca por uma identidade “pura” e abraçar a complexidade de quem somos. A psicanálise não promete eliminar todas as dúvidas sobre nós mesmos, mas nos oferece ferramentas para conviver com elas de forma mais leve. Ao reconhecermos que a sensação de fraude é compartilhada por todos, podemos nos permitir ser mais autênticos — não no sentido de sermos transparentes o tempo todo, mas no sentido de aceitarmos nossas contradições.

No fim, a grande lição é que não há nada de errado em sermos humanos, com todas as nossas imperfeições e ambiguidades. A verdadeira liberdade está em perceber que não precisamos provar nada a ninguém — nem mesmo a nós mesmos. A psicanálise nos lembra que, por trás da máscara, não há um impostor, mas simplesmente uma pessoa tentando encontrar seu lugar no mundo. E isso, por si só, já é o bastante.

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